"Ler é sonhar pela mão de outrem. Ler mal e por alto é libertarmo-nos da mão que nos conduz. A superficialidade na erudição é o melhor modo de ler bem e ser profundo."
Bernardo Soares
Livro do Desassossego

terça-feira, 17 de dezembro de 2013

O Ciclo da Esperança, de Sílvia Raposeira



Uma narrativa que mergulha constantemente numa analepse, e que nos leva a conhecer, em torno da personagem principal, dois momentos especialmente marcantes da sua vida. Aqui, o passado surge como o caminho para as decisões que são necessárias tomar no presente.

Vários momentos poéticos que se articulam e completam a narrativa, numa mistura que nos traz um excelente livro. Contudo, não é livro para ler de ânimo leve ou sem atenção, visto que a autora salta constantemente e sem aviso entre os dois momentos temporais.

Encontramos excertos (como os transcritos abaixo), com um excelente jogo de palavras e de sonoridades. Fazendo estes parte da ausência narrativa, ou seja, pertencendo a uma parte do livro que não faz um avanço substancial no decorrer da ação, simplesmente proporciona-nos o prazer de ler. A descrição de sentimentos interiores que revelam, leva-nos a refletir muitas vezes em torno da nossa própria vida, das nossas próprias ações e dos nossos próprios sentimentos.

“(…) deu-lhe trabalho acrescido nas horas vagas presentemente preenchidas de pensamentos vindos do passado, cozinhou-lhe enredos futuros e hipotéticos na mente em banho-maria, limpou-lhe teias de aranhas presas a cantos de outras eras, mas ferrou-lhe uma marca na alma que teimava em não desaparecer, brincado com sentimentos outrora sentidos e agora docemente acordados.” (p. 41)

Distância curta de mais para nunca se terem cruzado, mas há coisas que não estão nas nossas mãos decidir e o perto muitas vezes está longe” (p. 65)

“(…) em tantos anos ligados às Letras, se cansou de ler os mesmos livros e poemas, porque uma obra literária quando nos toca, agarra-se à nossa alma e passa a fazer parte de nós. É como uma droga da qual se depende e pela qual clamamos nos momentos de ressaca” (p. 84)


Ela ia esperar, mas ao mesmo tempo ia viver a sua vida, viver o que viesse para viver, assim como fazem os habitantes vizinhos do Vesúvio.” (p. 117)

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